terça-feira, 21 de julho de 2009

Lá te encontrei!

domingo, 12 de julho de 2009

Agarrados ao passado

Já são apenas pedaços de carne, definhando. Onde outrora se viram almas, vêem-se prisioneiros, defuntos, seres sem vida que vivem.
-Nem quero desperdiçar mais tempo com este grupo. Tudo lixo! Livrem-se deles.
Eu tinha de obedecer. A minha família depende do mísero salário que a câmara me dá. Tenho de os apanhar quando me pedem. Tenho de os queimar. Tenho de temperar o rio com as suas cinzas.
Eram quase cinco da manhã. O sol começava timidamente a nascer. Laivos ténues alaranjados iam surgindo no horizonte. Mais outro grupo para o rio. O terceiro desta noite.
Também já não têm salvação, tenho pensar assim.
-Bem, até amanhã à mesma hora rapaziada! Não quero atrasos! Hoje trabalhámos bem.
Despedir-me era um alívio. A sensação de voltar a sair das ordens de Lúcifer, de maltratar gente que nada fez. Sim, por um bem maior, claro, mas custa sempre. Principalmente quando o meu avô foi dado como lixo da sociedade no dia dez de Setembro de há dez anos. Ainda me lembro da data. Entraram pela casa a dentro, arrombaram a porta da dispensa, onde a minha avó o salvaguardava e levaram-no para dentro do camião. Um grande camião azul acinzentado, tal como o que guio todas as noites. Já o temos chefe, outro agarrado ao passado.
As ruas não avistavam ninguém, mesmo. Era só eu e a cidade. Eu e ela, sozinhos. Falávamos das memórias escritas em cada pedra de calçada. Podia falar de tudo. Falávamos mesmo, admito a nossa amizade. Ela queixava-se muito da sua solidão e abandono.
A minha casa era uma continuação do armazém de compotas. Ou o armazém era a continuação da minha casa. Não sei porque quando cá cheguei já os dois edifícios estavam construídos. Abri a porta com todo o cuidado para não as acordar. E dormiam que nem anjos, como sempre. Estava um livro aberto em cima da mesa-de-cabeceira. Por mais que lhe dissesse que era perigoso ler, ela não me ouvia, limitava-se a deixar o som passar suavemente pelo seu aparelho auditivo. Fechei o livro, guardando-o dentro do cofre, apaguei a luz e dei-lhes um beijo na face, adormeci.
-Bip… Bip… Bip Bip… Bip Bip… Bip Bip Bip… Bip Bip Bip… Bip Bip Bip Bip…
O toque do despertador começava a entrar-me pela consciência e já eu acabava de lavar os dentes, e vestir-me.
Era meia-noite. Outro dia de trabalho. Outro dia a banalizar a vida. Que deus me perdoe.
Hoje era a parte norte da cidade, mais limpa. Pelo menos, em seis anos de trabalho só tive de despachar um solitário.
Meia-noite e meia. Já estávamos todos no quartel. O chefe tinha acabado de chegar.
-Prontos rapazes? Vamos lá! Olhos bem abertos! Quero encontrar pelo menos um.
Já tínhamos percorrido quase todas as ruas da parte norte da cidade. Tudo limpo. Aliás, ruas sem ninguém. Mas a cidade transmitia-me um qualquer sentimento estranho, medonho, arrepiante. As ruas sussurravam umas às outras, mas eu não conseguia entender.
-Alto! Acho que temos companhia rapazes...
Um miúdo e uma mãe tremiam de frio num beco mesmo à nossa direita. Via-se nos olhos do chefe que tentava detectar se eram mesmo mendigos ou agarrados ao passado.
-Temos lixo! Livrem-se deles.
Eu tinha de os agarrar. Tinha de os acordar da morte por instantes e anunciar-lhes a mesma. O miúdo olhava-me como se me pedisse, suplicando, uma oportunidade. A mãe olhava-o com pena, ou olhava-o e sentia pena de uma qualquer memória que passava de momento na sua mente. Eles eram morte. Mas estavam vivos. E eu tinha de os agarrar, para os queimar, e temperar de seguida o rio com as suas cinzas.
-Não consigo chefe! Não consigo. Todos nós somos agarrados ao passado, ou pelo menos o instinto leva-nos a ser. Nem que apenas por uns minutos durante um dia das nossas vidas. Este miúdo merece uma vida. Vive de memórias, tudo bem. Mas vive. Quem somos nós para decidir que viver no presente e no futuro é mais saudável que viver no passado? Somos tudo menos saudáveis. Somos todos lixo! Todos! Mais nós que eles, que vivemos segundo regras impostas por outros, que temos de chamar verdades! Não vivemos, sobrevivemos. Será que vale a pena? Vivemos todos miseráveis, não podemos ler, não podemos criar…obedecer, obedecer. Eu não vou sujar mais as minhas mãos e consciência. Se quiserem, lancem as minhas cinzas para o rio, já que eu penso, ponho em causa e por vezes desobedeço!
-Se é a tua vontade, fazemos-te esse favor…
E assim foi. Tudo simples, nada de complicações. Também nunca gostei de complicações, e não haveria de ser no momento da minha morte. Agarraram-me e deitaram-me para dentro do camião, tal como o meu avô. As nossas histórias entrelaçaram-se. A minha com a do meu avô. A minha com a da cidade.
As cinzas vagueando pelo sangue da cidade. Eu e ela novamente, sozinhos.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Animação

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Concerto dia 21 de Fevereiro - Angel's Bar/ Praia de Carcavelos... apareçam!

sábado, 24 de janeiro de 2009

Talvez

Dei-te

mas não quiseste.

Aceitaste
embora nunca acreditasses.

Fingiste bem,
ou então erras 
como nunca te perdoarás.

Tudo talvez,
nada certo,
como sempre...


Tarde de mais

Já vai ser tarde,

quando ouvires o silêncio
dos meus beijos tenros
que outrora te despiam o pescoço
de qualquer dúvida.

Já vai ser tarde,
quando as paredes do teu quarto
se transformarem em arames afiados,
asfixiando-te continuamente.

Já vai ser tarde, amor,
quando a vida te for simplificada
e se revelar perante os teus olhos
como uma virgem despida pela primeira vez.

Aliás, já é tarde,
porque do meu coração
só sobrou sumo,

E esse sumo
já tu bebeste...

sábado, 3 de janeiro de 2009

Um dia, da janela do meu quarto

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Conto - "Prelúdio"

Os bancos, todos pintados de fresco, admiravam as raparigas a passear, sorrindo.
Na realidade não são muitas as raparigas a vaguear pelas ruas desta pequena e solitária aldeia. E ainda mais raro é viver cá alguma. E as que vivem ficam bem é fechadas em casa.
Eu era mesmo o único jovem da aldeia, até nascerem os gémeos da dona Gertrudes: os dois gordinhos como texugos, pela quantidade monumental de comida que lhes davam e também pelos inevitáveis genes.
A dona Gertrudes é de facto uma mulher forte. Forte para não dizer cheiinha. Cheiinha para não dizer gorda. E os gémeos sempre a chorar. Chorar era o pão-nosso de cada dia naquela casa: quando tinham fome, choravam; quando tinham sede, choravam; quando tinham necessidades, faziam.
Lá andava a dona Gertrudes, viúva de nascença, sempre atarefada, de um lado para o outro, desse ainda para outro diferente, para o primeiro outra vez, e isto continuadamente.
O único lugar em que sentia realmente sossego era o seu quarto à noite um a dois dias por semana. O seu quarto à noite um a dois dias por semana era diferente do seu quarto de manhã e de tarde nos os outros dias; deixava de fazer parte da casa e passava a ser um espaço só seu. Esse espaço transformava-se quando eram transmitidos jogos do Benfica num dos quatro primeiros canais (porque não havia dinheiro para televisão a cabo, e mesmo se houvesse, o cabo não chegaria à aldeia); durante a semana para as taças europeias e ao fim-de-semana para o campeonato ou para a taça.
O marido da dona Gertrudes, na verdade, se ela existir, não era o que se sentava na sala aquando os jogos do Benfica. O coração da senhora estava preso, desde a sua nascença, a James Dean.
No seu quarto eram mais as fotografias do actor norte-americano do que pedaços de parede visíveis. A sua figura estava presente em cada enquadramento do olhar possível e imaginário dentro daquele pequeno cubo.
Este era um dos poucos divertimentos que eu tinha: espiar a casa e o dia da dona Gertrudes e da sua família. Outras, eram monótonas e permitidas, ou melhor, deveres de um jovem de uma pequena e solitária aldeia.
Meio-dia! O único sino da igreja do Padre Sidónio cantava a mesma melodia que me lembro desde o dia que nasci: tim tom tam tum tum tim tam tom. Esta frase era repetida até despertar os ouvidos dos mais idosos e fazia-se ressoar por toda a aldeia, pelos campos, até a linha do horizonte a acalmar, despindo-a, suavemente, deixando-a escorrer até se ouvir o silêncio do vento a roçar nas ervas secas.
Saí de casa rapidamente, pois já se ouvia o silêncio do vento a roçar nas ervas secas. As ruas estavam caladas, como é hábito àquela hora, mas essa ausência de diálogos era abafada com o saltitar de uma bola. Dois miúdos faziam-na rolar, transpiravam por não estarem habituados a correr tanto e pelo calor que as pedras da calçada, queimadas pelo sol, sopravam para a atmosfera.
Olha, olha! Passa-nos a bola! Os miúdos gritavam na minha direcção, mal-educados pela sua inocência. Nestas alturas prefiro deixar o meu orgulho sentado, descansando, e passar a bola.
O meu estômago já fazia barulhos e movimentos estranhos, como se eu o estivesse a insultar, ao meu cérebro e ao meu conjunto. Cheguei finalmente ao café central, que desde a morte dos meus pais servia-me, todos os dias, um bitoque de porco. Até agora nunca me fartei do prato, porque não só sabe a bitoque de porco como também a amor e preocupação do senhor João e da dona Maria.
Ouvi o sino na igreja do Padre Sidónio… já era uma da tarde! Hoje tinha de plantar os feijões que prometi ao meu pai momentos antes de se despedir de mim. Quando os feijões começarem a crescer, crescerás com eles… quando morrerem, plantas outros e continuarás a crescer, disse-me.
Ouvindo isto, somando à minha superstição e ao respeito pelo meu pai, prometi-lhe e a mim mesmo, aquando o começo da época quente, começar uma plantação num terreno de ninguém, que me servia de abrigo nos meus dias mais reflexivos.
Dois palmos à direita da igreja, três para mim por ter a mão pequena, estava o terreno de ninguém, visto do cimo da montanha de separação da aldeia com o rio.
O final da tarde já não parecia do mesmo dia, mas afinal tudo na vida pode mudar completamente de um momento para o outro.
Abri ligeiramente a mão e aproximei-a da terra, ou a terra aproximou-se dela, e tentei sentir e distinguir cada partícula mínima de olhos fechados. A terra estava mais seca que nunca, apesar de estarmos na época quente.
Às vezes apetece-me passar dias a observar. A analisar tudo o que vejo. Este era um desses dias. Ou melhor, ultimamente todos os dias têm sido assim.
O sol começava a pôr-se à medida que o único sino da Igreja do Padre Sidónio ia parando de vibrar. Eram oito da noite.
Apressei-me a chegar a casa. As ruas estavam desertas, mas ao mesmo tempo cheias, de significado. A ausência de pessoas parecia fazer com que as memórias, adormecidas, saíssem à rua. E quem estivesse acordado, só, aventurando-se na noite e no silêncio, assistia a um fenómeno estranho, fascinante pela sua singularidade.
Vi as estórias da mãe da dona Gertrudes, que tinha sido em tempos namorada do meu avô. Ele, malandro como era, pelo que dizem, decidiu-se apaixonar por uma rapariga nova na aldeia, linda, ou melhor, demasiado linda aos olhos da gente da terra.
A menina traz pecado, diziam os mais velhos. Mas o meu avô não se importou. Um dia decidiu ir à padaria onde ela trabalhava, e sem modos nem pedidos, arrancou-lhe um beijo nunca antes visto naquela pequena e solitária aldeia. Tão grande que fez desfalecer a dona da padaria, amiga da mãe da mãe da dona Gertrudes, contra o pão acabado de fazer.
A mãe da dona Gertrudes, quando soube da estória, nunca mais foi a mesma. Passou de apática a nada. O cérebro bloqueou-se-lhe.
Acabei por chegar a casa, farto de imaginar e relembrar. Entrei pela porta das traseiras, deixando os pés arrastarem-se silenciosamente, acariciando as tábuas de madeira coladas ao antigo chão de cimento.
Assim foi até chegar à minha cama. Consegui tanto silêncio a deitar-me que quase nem me apercebi que me tinha deitado. Adormeci.
Acordei com o sino da Igreja do Padre Sidónio: tim tom tam tum tum tim tam tom.
O sol batia-me na cara com os seus raios, imponentes por ser meio-dia, certamente. Tinha-me deixado levar pelos sonhos outra vez, pela vida cheia de maravilhas que acabava por não viver.
Vesti-me rápido para não chegar atrasado ao bitoque de porco que já devia esperar, se tivesse vida.
Pé à frente, outro ainda mais à frente, contava os meus passos até chegar ao café central. Já ia em duzentos e sete, duzentos e oito, nove talvez, posso me ter enganado algures.
Comecei a ouvir uma melodia suave, dançando pelo ar, voando e rodopiando livremente, solta, sem medo, inocente. Tentei perceber de onde vinha aquela doce voz.
Devia estar a sonhar, de certo. Ou então pior, alucinava.
Uma rapariga nesta pequena e solitária aldeia… E não uma rapariga qualquer. Ou melhor, nem era uma rapariga. Um anjo provavelmente, caído do céu para me amar, ou então para me arruinar.
Nunca tive grande sorte com raparigas. Ou melhor, nunca conheci nenhuma da minha idade.
Permaneci imóvel, a estudar cada um dos seus movimentos. Era tão suave a maneira com que ela levantava alguns cabelos para não lhe taparem os olhos verdes, únicos, brilhantes e verdadeiros, calmos e apaixonados por si.
Começava a anoitecer. Tinha passado horas a olhá-la, sem que ela se apercebe-se, ou eu. Apaixonei-me pela sua imagem, ou pela imagem que lhe atribuí. O certo é que me tinha deixado apaixonar, deixado levar por aqueles olhos verdes, únicos, brilhantes e verdadeiros, calmos e apaixonados por si.
Virou-se para mim. De repente o meu coração parou, acelerando, pensando que acabávamos de trocar o primeiro olhar. Mas não, ela tinha-se assustado ao ouvir o sino da Igreja do Padre Sidónio, que eu, por tanta cegueira, nem tinha sequer ouvido.
Começou a andar em direcção ao rio. Os bancos, já quase carecas de tinta, admiraram-na, calando-se por momentos, deixando os seus diálogos existenciais, de observadores.
Pisou com alguma pressa a última pedra de calçada da aldeia, correu pelo descampado de ervas secas e parou. Parou sentando-se ao lado da “minha” árvore. Desde pequeno que me sentava na sua sombra, deixando-me levar pelas perguntas que me iam surgindo.
Tremendo, aproximei-me. A única maneira de ser visto era chegar junto da árvore. Ao aproximar-me, ela levantou-se e, com a mão direita apoiada no tronco, foi dando voltas como um ponteiro de relógio, cantando. Eu já estava perto, segui-a.
Nunca nos encontrávamos, ela num lado, eu noutro, olhávamo-nos sem nos vermos. Ela pressentia-me, eu a ela, isto continuadamente.
Por fim parou de repente. Quase fui contra o seu corpo por não estar preparado para tal confronto. Os seus olhos verdes, únicos, brilhantes e verdadeiros, calmos e apaixonados por si, atravessaram-me a alma com um olhar fixo e profundo.

Esse olhar perdurou. Perdurou para a eternidade. Vi nos olhos dela algo mais que beleza. Vi tudo, vi a verdade. Ou pelo menos a verdade que me interessa.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Fotos de Bárbara Fonseca - www.flickr.com/_barbarella
























sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Vê se aprendes a viver - Art Music Bar

Sozinha rias p'ra mim - Art Music Bar

Sorriso Milagroso - Art Music Bar

The Saddest Reggae Song - Art Music Bar

Sombra (às 2 da tarde és mais gorda do que eu) - Art Music Bar

Diálogo - Art Music Bar

Um agradecimentos especial aos grandes jovens músicos deste projecto e, como não podia deixar de ser, à rapariga inspiradora de muitas das minhas letras! Muito Obrigado a todos, e é para continuar!

domingo, 13 de julho de 2008

Exercício Audiovisuais 2

Exercício Audiovisuais 4

Exercício Audiovisuais 5